Isso dá pano pra manga pra mais de uma semana de viagem nas lotações cariocas.

 

Entro na van na esperança da resenha fúnebre, e logo em padre miguel entra a mediadora do debate.

 

Jana, uma morena de aparentemente uns 35 anos, desbocada, cabelos na altura dos ombros, óculos escuros da "Doce Cabana" encontrados por R$9,99 no centro comercial popular antigo camelódromo, vestindo um conjuntinho de sarja, calça e tayer bege e um colar de pérolas falsas que faria parte do figurino do Falcão facilmente.

 

Logo Jana reconhece duas amigas sentadas na última fileira da van, ao meu lado.

 

Uma era Beth, uma senhora com sotaque nordestino carregado e um perfume de leite de rosas que fazia meu nariz escorrer em bicas a viagem inteira, velha maldita. A outra era chamada de Tita, baixinha e falante, tirava onda de saber das notícias em tempo real com o bordão " Vi na internet!", benditos planos de internet a 50 centavos para celulares.

 

Com o calor de praxe, e os engarrafamentos que mais pareciam estacionamentos, já que os carros não andavam, Jana começa a resenha:

 

Jana:

- E a "Wiltnem, né?"

 

 

Beth: "- coitada era uma cantora póórrêêta!"

 

Tita:  -Vi na internet que ela era envolvida com drogas..."

 

 

Jana era meio, digamos, tinha um linguajar menos coloquial...

 

 

Jana: "- Era uma crackuda! Isso sim!

 

e logo deu a ficha completa da moça...

 

"- Começou fumando um baseadinho, depois foi pro pó e aí veio o crack! Devia estar até pelas ruas assaltando as pessoas pra comprar drogas!"

Intimidade é uma merda, viu.

 

Logo imaginei Whitney me enquadrando dentro de um busão com sua voz potente e um canivete na minha barriga, cantando "Endããããããããã iãããããã, iu ól ueis róooob uuuuuuuuu, uuuuuuu"
( I will always love you)

Estilo fantástico mundo de Bob

 

Bom, como isso não tem mais jeito de acontecer, voltamos ao papo.

Tita então corta o assunto e lança Wando na pauta...

 

"- E o Wando hein..."

Isso é típico de quem quer levantar comentários, joga no ar com reticências e tudo.
Tipo, poderia ser qualquer coisa.

Ex.: E o Wando hein, morreu que pena.
Ex.: E o Wando hein, já foi tarde.
Ex.: E o Wando hein. Quem é Wando?

Bom, Beth respondeu prontamente:
"- Tô chóóócada atééé agora!

(Esse exagero de "ó "e "é" foi pra tentar ambientar o vc ao sotaque carregado)

Jana sempre imparcial, e educada em colégio de freiras, olha por cima dos óculos e diz:
"- Porque chocada?"
"- Tava morto faz tempo, e vivia fazendo show em zona pra sobreviver...tarado beiçudo"

Beth era mais emotiva:
"- Ai Jââna, num falassim...eu góstarra tânto dar música..."

Jana:
"- Poora Beth, tá de sacanagem? Esse cara não lançava uma música nova desde Roque Santeiro..."
"- Tinha que ter lançado era uma fábrica de calcinhas, isso sim".

Tá ligado na dica de novos negócios? #fikadika

Beth:
"- Eu tenho fita dele até hôôgee...já namorei muito ao som delas."

Sim, caros leitores, fita.
Você que segue este blog e tem menos de 20 anos, talvez não saiba o que é uma fita cassete.
Fita casseta era aquilo que você colocava pra tocar numa musiquinha lenta, gravada diretamente do "Good Times 98", ficava dando pause a cada comercial pra gravar direitinho, e quando estava lá na hora do "meu iaiá, meu ioiô", a desgramada acabava e você tinha que ir até ao aparelho, dar um eject e virar para o lado B, quebrando todo o esquema montado...

 

Enfim, sobe a trilha da moça ae...

"Me suja de carmim
Me põe na boca o mel
Louca de amor
Me chama de céu
Oh! Oh! Oh! Oh! Oh!"

 

Na hora Tita consulta seu Smartphone e busca no google notícias do assunto em tempo real...

Ê mudérnidade!

Mas, internet de 50 centavos é assim mesmo, demora uma vida pra carregar...o motorista da vanzoca veio tão rápido que quando provavelmente carregou a notícia no telefone da moça, chegou ao ponto final e eu desci.

Vlw piloto!
Você é luz, é raio, estrela e...ainda bem que veio rápido!

 

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